O NEGACIONISMO E O REVISIONISMO HISTÓRICO: ALERTAS CONTRA O ANTISSEMITISMO

Rachel Mizrahi

Passaram mais de 70 anos desde que os aliados quebraram as forças do nazismo na Europa. A Alemanha, mesmo ocupada e dividida reergueu-se, recuperando-se, economicamente. Não de forma milagrosa, como muitos acreditam. No final da Segunda Guerra, um parque industrial moderno – implantado pelos nazistas – pôde ser acionado, porque somente 6,5% de equipamentos da produção industrial foram destruídos nos bombardeios aliados. O crescimento econômico e a Social Democracia da Alemanha Ocidental nos anos 60 do século passado levaram o país ao “bem-estar social”, espelhado no modelo americano.

Os primeiros anos da desnazificação (1945 a 1950) não foram fáceis para a sociedade alemã, especialmente para a geração que participou do regime nazista e da ascensão de seus líderes ao poder. A totalidade ou a quase totalidade da população participara do sistema e, as atrocidades cometidas pelo regime foram amplamente divulgadas, gerando forte sentimento de culpa nacional.

Até os anos 50, o fardo da culpa foi redimido pelos pagamentos de reparação da Alemanha aos sobreviventes do Holocausto e a Israel. Poucos anos depois, em 1962, quando ocorreu o julgamento de Adolf Eichmann em Jerusalém, a rica e democrática Alemanha, incomodada com o ocorrido, buscou encontrar uma imagem positiva de seu passado: a guerra do Vietnã bem como a divulgação da violência impetrada pelos americanos permitiu o seguinte questionamento: por quê a Alemanha deveria continuar sozinha carregando o “fardo da violência”, pois o morticínio não foi prática exclusiva do nazismo, ainda que o Holocausto o fosse.

Buscando reafirmação nacional, a reconquista da dignidade e orgulho da germanidade forças conservadoras tentaram em 1985, unir vencedores e vencidos na passagem dos 40 anos do fim da Segunda Guerra no cemitério militar de Bitbourg com presenças do Presidente Ronald Reagan e de Helmut Kohl. A homenagem levantou uma grita geral de democratas, especialmente nos Estados Unidos: 40 anos não eram bastante para que se pudesse homenagear soldados alemães e membros da SS como vítimas da guerra. As feridas não estavam cicatrizadas e, o passado não poderia ser ainda enterrado….

Essa situação desconfortável para os alemães desencadeou uma batalha de historiadores. Alguns deles argumentavam que se o passado nazista se recusava a passar, era preciso reconstruí-lo; se as imagens dos vagões de gado e dos fornos crematórios não queriam se apagar, era necessário que profissionais se apossassem deles para retocá-las. Como escreveu Josef Joffe, “se não se podia limpar a mancha ancestral, talvez fosse possível fazer os crimes (nazistas) empalidecerem, jogando sobre os (crimes) dos outros uma luz ofuscante”. Assim, se o passado não passa – graças à memória que dele guardam os sobreviventes e os que estudam seus testemunhos – alguns historiadores buscaram a partir dos anos 1960, reinterpretá-lo.

Os nacionalistas procuraram minimizar o nazismo, questionando: o que significa o “período de apenas 12 anos” diante da “milenar história da Alemanha”? O “breve desvio histórico” teria sido apenas uma resposta – dura, é verdade, – à crise europeia mais do que uma continuidade da própria história alemã; afinal, Hitler “nem alemão era”. O nazismo teria cumprido, com todos os seus aspectos desagradáveis, a função necessária de uma revolução burguesa tardia, reagindo à permanência de uma ordem feudal e aristocrática no país, herdada do Império Alemão, que a República de Weimar (1918-1933) não conseguira superar.

Como a estrutura social da Alemanha era extremamente rígida e hierarquizada, paralisando a própria ação parlamentar, o povo teria encontrado no movimento nazista uma política social eficiente que – não podemos esquecer – conseguiu tirar oito milhões de alemães do desemprego em apenas quatro anos. Além disso, o nazismo modernizou o país, criando indústrias limpas e eficientes, organizações trabalhistas avançadas, autorodovias que unificaram regiões trazendo benefícios materiais que puderam nivelar as classes sociais.

Esses historiadores não negam o Holocausto. Simplesmente evitam sua problemática, descaracterizando-o como fenômeno único na História, levando-o assim, pouco a pouco ao olvido.

Estudiosos radicais, conhecidos como “revisionistas” partem da assertiva de George Orwell, em 1984, de que “quem controla o passado também controla o futuro”. Para eles, a “Solução Final” não foi uma proposta nova. Na realidade, Karl Marx foi seu precursor ao propor a “extinção da classe burguesa”. O estado de guerra – que teria sido provocado por alguns judeus – justificaria os crimes de Hitler. De resto, Stalin, Truman e os soldados americanos no Vietnã não teriam deixado por menos. Tudo deve ser amalgamado e confundido para diluir a culpa alemã numa esmagadora História da Barbárie Universal.

Finalmente, os “Negadores do Holocausto” ousam dar um passo além na destruição da História. Apoiados por pseudo-cientistas espalhados pelo mundo, até no Japão, divulgam, através de jornais, livrecos, revistas, vídeos, Internet e outros meios baratos de comunicação, que o “Holocausto nunca existiu”. Tudo não passaria de mentiras divulgadas por judeus sionistas objetivando o declínio do Ocidente e a extorsão do povo alemão, para o crescimento do Estado de Israel. Alegando a inexistência de um plano para o assassínio em massa dos judeus e considerando que a “Solução Final” nada mais foi que a emigração dos judeus para o Leste a fim de reuni-los num só lugar. Esse grupo de negadores tem atraído jovens ignorantes do passado para grupos e partidos extremistas que almejam o retorno do fascismo.

A consciência do Holocausto não impediu que o antissemitismo virulento ressurgisse. A guerra contra os judeus, deflagrada em 1939, continua. A negação do Holocausto é a mais cruel manifestação do antissemitismo atual, atingindo de imediato, os sobreviventes já idosos, novamente vitimados, agora em sua memória. E, depois, todos os que desejavam fazer dessa memória uma barreira contra o mal que não deveria jamais se repetir.

Hoje, existem mais de 300 obras de caráter negacionista circulando pelo mundo, inclusive no Brasil, onde a Editora Revisão e a empresa de vídeos piratas Scotton Internacional, ligadas ao alemão Sigfried Ellwanger, editam e distribuem livros e vídeos de “cultura histórica”, propagando amplamente a versão nazista da Segunda Guerra para as novas gerações.

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