Injustiça entre países alimenta caos no Oriente Médio

Principais trechos de artigo de Baher Eldin Hassan, diretor do Instituto de Estudos de Direitos Humanos no Cairo, especial para “THE NEW YORK TIMES”.

O Oriente Médio, como o conhecemos há mais de um século, está prestes a desaparecer, dando lugar a uma nova face desenhada pelo caos. Os governos centrais de pelo menos cinco países árabes -Síria, Iraque, Líbia, Sudão e Iêmen- perderam o controle de grande parte de seus territórios para grupos armados de oposição. Uma mistura de guerras civis, sectárias ou raciais está infestando esses países, e há poucos sinais de que os conflitos irão diminuir. A guerra global ao terror de 15 anos falhou de modo geral, e os grupos terroristas e milícias radicais recuperaram a iniciativa.

Em consequência da violência e do desespero em toda a região, o mar Mediterrâneo tornou-se o maior cemitério do mundo. Em menos de quatro meses, 1.700 solicitantes de asilo que fugiam de guerras civis, das terríveis condições econômicas e da repressão sistemática morreram no mar, 30 vezes mais do que no ano passado. Quase 4 milhões de pessoas fugiram da guerra civil na Síria, segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados.

Um sofrimento tão terrível é o resultado de décadas de graves injustiças sociais, extremismo islâmico, amplas violações aos direitos humanos e falta de boa governança.

Os países que mais sofreram com décadas de repressão política, sectária e racial sistemática e homicídios em massa -Iraque e Síria- tornaram possível a fundação do Estado Islâmico…

Nesse contexto, as populações da região árabe têm dificuldade para responder à pergunta: o que representa o “verdadeiro islã”? É o EI, que publica vídeos de suas decapitações no YouTube, ou a Arábia Saudita, que decapita pessoas em público? É o EI, que usa a “lei islâmica” para justificar o estupro em massa de mulheres não muçulmanas no Iraque, ou é o governo sunita do Sudão, que usa o estupro em massa de mulheres não árabes como tática de guerra?

É o EI, que defende a chacina de minorias não muçulmanas; o governo alauíta de Bashar al-Assad, que lançou bombas de gás contra cidades sunitas na Síria; ou o governo de Abdel-Fattah al-Sisi, que executa chacinas nas ruas do Egito e permite sentenças de morte em massa por meio de seus tribunais politizados?…

Os ataques terroristas são vistos por alguns governos árabes não como ameaças, mas como oportunidades de comprar a aquiescência de seus cidadãos e o silêncio da comunidade internacional sobre seus crimes contra os direitos humanos.

Esses governos aplicam leis de terrorismo draconianas, que são usadas para atingir liberais pacíficos, dissidentes islâmicos e defensores dos direitos humanos. O Egito é o exemplo mais notável dessa abordagem.

Está na hora de os líderes árabes escutarem as vozes morais e racionais de seus cidadãos. Na véspera da cúpula da Liga Árabe, dois meses atrás, 26 organizações árabes de direitos humanos entregaram uma carta aos reis e presidentes do grupo político, pedindo para “reconsiderar as políticas que levaram a região árabe a essa conjuntura catastrófica, sem precedentes na era moderna”, e “criar uma estratégia eficaz com base nas lições aprendidas com o enfoque unilateral em soluções de segurança e militares”.

O que torna a situação da região mais terrível é o fracasso do mundo em condenar essa opressão, voltando um olhar cego para as raízes da radicalização.

Defender os direitos humanos e confrontar o extremismo religioso, trabalhar para pôr fim à discriminação contra as populações sunitas da Síria e do Iraque, assim como contra os beduínos da península do Sinai, são os primeiros passos em uma jornada de milhares de quilômetros.

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