Cardeal Koch e comunidade judaica celebram em São Paulo 50 anos de reconciliação

Em cerimônia que reuniu 250 pessoas na noite de 2 de setembro em São Paulo, a Arquidiocese de São Paulo e a Confederação Israelita do Brasil (Conib) celebraram os 50 anos da publicação da declaração Nostra Aetate, promulgada pelo papa Paulo VI em 1965 e que aproximou judeus e católicos após 2.000 anos.

Participaram da comemoração, no Teatro Tuca da PUC-SP, o cardeal suíço Kurt Koch, presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos e da Comissão para as Relações Religiosas com os Judeus, o cardeal Odilo Scherer, o rabino Michel Schlesinger, o presidente da Conib, Fernando Lottenberg, o secretário de Estado Floriano Pesaro – representando o governador Geraldo Alckmin – autoridades políticas e religiosas, além de dirigentes comunitários.

A B’nai B’rith esteve presente com o presidente nacional Abraham Goldstein e esposa, o vice-presidente Edgar Lagus, o presidente da Loja Bandeirantes, Hans Bergmann (co-fundador do Conselho de Fraternidade Cristão-Judaica de São Paulo, em 1962), Zeila Sliozbergas, da Loja Anne Frank e a assessora de Direitos Humanos Lia Bergmann.

Em seu pronunciamento, lido em português, o cardeal Koch disse estar feliz com este dia de comemoração, pois “a Nostra Aetate marcou uma importante mudança de orientação na relação entre judeus e católicos”.

Ele notou que o texto da declaração foi aprovado no Concílio Vaticano II por 2.221 votos contra 88, e que as práticas recomendadas foram confirmadas por todos os papas pós-Concílio. “A Nostra Aetate não perdeu a atualidade, ela continua servindo como bússola na reconciliação. Como declarou o papa Francisco, diante da atual onda de antissemitismo: ‘não se pode ser cristão e antissemita’”.

Koch lembrou que a Nostra Aetate não começou no Concílio, iniciado em 1962, ela começou a surgir e a se configurar em acontecimentos anteriores. Em agosto de 1947, 65 judeus e cristãos se reuniram na Suíça com o objetivo de erradicar o antissemitismo. Alguns dos pontos lá discutidos foram encampados pela declaração, na qual, “pela primeira vez na história, um Concílio se pronunciou de forma tão explícita sobre a relação com os judeus e o judaísmo”.

Ainda que a declaração não se refira apenas aos judeus, Koch considera que a relação entre católicos e judeus é especial, “que não temos com nenhuma outra religião, pois não se pode compreender a Igreja sem o judaísmo”.

Referindo-se à visão paulina de herança espiritual comum entre judeus e cristãos, Koch afirmou: “Somos ramos diferentes e interdependentes de uma mesma árvore. O Velho Testamento faz parte do legado da Igreja. Considerar que o Novo Testamento ultrapassou o Velho é uma visão perigosa, que nunca foi parte da doutrina oficial da Igreja”.

Koch concluiu: “Judeus e cristãos mantiveram sua crença e, por isso, permanecem indissoluvelmente ligados”.

O presidente da Conib, Fernando Lottenberg, afirmou que a presença do cardeal Koch no Brasil é “um expressivo reconhecimento do trabalho de aproximação que judeus e católicos vêm desenvolvendo no país, ao longo das últimas décadas.

Em nossos dias, o extremismo religioso, supostamente em nome de Deus, procura tomar a cena….Festejar essa declaração significa, por um lado rechaçar toda forma de fanatismo e, por outro, reafirmar o compromisso da comunidade judaica brasileira com o pluralismo.

Neste contexto, as conquistas obtidas por judeus e católicos, nas últimas décadas, devem servir de evidência sobre a capacidade que possui o homem de superar conflitos do passado e construir pontes de coexistência. É dever, dos homens e das mulheres de bem, defender com firmeza seus ideais e convicções. E é também por isso que estamos aqui esta noite..

Ele lembrou os pioneiros deste trabalho, cujo desenvolvimento deve prosseguir, “levando a mensagem de entendimento e de paz para a periferia das grandes cidades e para o interior do Brasil”, completou.

Dom Odilo Scherer lembrou o papel fundamental do papa João 23, que convocou o Concílio Vaticano II e pediu novas atitudes para com os judeus. O arcebispo de São Paulo notou que o desenvolvimento do diálogo foi e tem sido particular na cidade, com muitas manifestações públicas ao longo dos últimos 50 anos e, hoje, uma firme disposição para continuar avançando.

Michel Schlesinger, rabino da Congregação Israelita Paulista e representante da Conib para o diálogo inter-religioso, afirmou que, “no cenário de hoje, a Nostra Aetate não é uma opção, mas uma obrigação”.

“João 23 foi um visionário, pois transformou 2.000 anos de desconfiança e perseguições em50 anos de respeito, diálogo e compreensão”, acrescentou.

Ele destacou que os judeus também escreveram um documento que delineou as relações com os cristãos, destacando os pontos de convergência. Foi assinado por 220 rabinos e publicado em Nova York, no ano 2000, com o nome de “Dabru Emet” [“Digam a Verdade”, ou também “Conversem com Verdade”].

Ele cita, no final, Isaías 2:2: “E acontecerá nos últimos dias que se firmará o monte da casa do Senhor no cume dos montes, e se elevará por cima dos outeiros; e concorrerão a ele todas as nações”.

O secretário Floriano Pesaro abordou o texto da Nostra Aetate e afirmou que “todos os credos deveriam explicitar essa tolerância”.

O monsenhor Thomas Grizza, representando o núncio apostólico no Brasil, dom Giovanni D’Aniello, disse que a tarefa do Concílio Vaticano II não foi completada: “Os documentos são apenas o ponto de partida; a vida dos povos e da Igreja deve ser impregnada por seus ensinamentos”.

Fonte: Conib

CardealK1
Vista parcial do público
CardealK2
Mesa diretora do evento Fotos Evento Tuca – Eliana Assumção

 

A B’nai B’rith e o Diálogo Cristão Judaico

Artigo sobre a atuação da B’nai B’rith na construção e consolidação do diálogo cristão judaico no Brasil, ao longo dos últimos 53 anos.

Leia em: www.bnai-brith.org.br

Veja também

B’nai B’rith participa do II Encontro dos Centros de Educação em Direitos Humanos da Cidade de São Paulo

B’nai B’rith participa do II Encontro dos Centros de Educação em Direitos Humanos da Cidade …